Você Quer Estar Certo, ou Ser Feliz?
O fato ocorreu lá pelos idos de 2001 ou 2002, quando eu acabava de assumir a minha primeira posição de gerência em uma grande multinacional em São Paulo. Por alguma razão que é hoje irrelevante para o nosso tema, eu me sentia injuriado e extremamente frustrado com a maneira como eu havia sido tratado por um de meus superiores. Havíamos tido uma acalorada discussão na qual meus argumentos, bastante lógicos e bem embasados em minha então nada modesta opinião, haviam sido rechaçados de forma direta e absoluta pelo simples uso da posição hierárquica mais elevada de tal profissional. Nada que eu pudesse ter dito ou argumentado teria qualquer peso ou validade. A coisa foi decidida de forma contrária ao que eu havia recomendado e pronto. Fim de conversa.
Voltei para minha mesa literalmente soltando fumaça pelos ouvidos. Estava tão irritado que não podia pensar em mais nada. Notando minha indignação, um diretor que havia ouvido a conversa se aproximou e buscou me acalmar. Aproveitando o ouvido amigo, passei a queixar-me da injustiça e da decisão, a meu ver nada inteligente, que havia sido tomada.
_ Como pode eles fazerem isso? Não enxergam? Estão equivocados! Vão dar com os “burros n’agua”! Escreva o que estou te dizendo. Depois não digam que eu não avisei.
O diretor olhou para mim e calmamente me fez um questionamento que mudaria minha vida.
_ Marcos, você quer estar certo, ou quer ser feliz?
Um pouco atordoado, olhei para ele sem entender exatamente o que ele queria dizer, e pedi que me repetisse a pergunta. Ele riu, e notando que finalmente havia conseguido resgatar-me do transe de ira que momentaneamente me possuía, explicou-se;
_ Pois é muito simples. Em muitas situações na vida, sabemos em nosso íntimo que temos razão em um argumento ou em uma discussão, mas isso na verdade pouco importa. No fundo, muitas decisões são tomadas ou várias coisas acontecem por motivos fora de nosso controle. Admiro muito a paixão e a intensidade com que defende seus pontos de vista, mas você precisa desenvolver a habilidade de desapegar-se da necessidade de estar certo. Mesmo que você esteja, na maioria das vezes as pessoas farão o que elas acham que devem fazer, independentemente de sua opinião. Seguir argumentando e encompridando discussões só te trará sofrimentos. Querer que tudo seja à sua maneira é uma questão de ego, me entende? Você já fez sua parte. Agora deixe o assunto pra lá e siga sua vida. Ela é muito mais do que essa discussão, e ficar infeliz por tê-la perdido, independente do motivo, não vale a pena.
Confesso que por alguns minutos, refutei tal conselho. Naquela altura de minha vida, estar certo e ser feliz eram sinônimos. Eu só me sentia realizado quando ganhava uma discussão, e ser vencido pelo simples exercício do poder de um superior hierárquico me irritava profundamente. Mas depois de ponderar sobre as palavras daquele conselho amigo, revisei minha posição. Ele tinha toda razão. Era tudo uma questão de ego. Eu precisava estar certo para me sentir bem, e as duas coisas devem ser absolutamente desassociadas, sob pena de nos causar grandes aborrecimentos, não só na vida profissional, mas também e principalmente na vida pessoal.
Desde então, este conceito se transformou em uma espécie de mantra em minha vida, ao ponto de me ajudar a evitar quase todo tipo de discussão e gerar uma imensa e desejada paz. E como consequência, tem me servido de plataforma para manter e até fortalecer relações profissionais, de amizade e porque não dizer, até mesmo laços familiares. E tudo baseado no simples princípio de tirar o meu ego do caminho.
E não se trata de se omitir ou simplesmente deixar de opinar. Sempre que oportuno, deixo claras as minhas posições ou pontos de vista, mas já não tenho a necessidade de prová-las melhores ou mais corretas que opiniões alheias. Se discordam de mim, escuto, pondero e sigo em frente, em paz com minhas convicções e com as pessoas envolvidas em tais conversas.
Quando me dou conta de que fui arrastado a uma discussão em razão de meu ego estar buscando um reforço ou uma defesa, tenho procurado racionalizar e empatizar com meu “oponente” tentando ver o mundo desde seu ponto de vista. Muitas vezes a pessoa envolvida está apenas tentando justificar um comportamento ou uma decisão, e tirar-lhe a razão será algo humilhante e dolorido. Em outras, está defendendo uma ideologia ou posição política, e fazer-lhe sentir-se equivocado significará trazer-lhe dolorosas revelações. Evidenciar a um amigo que seu time do coração não está bem e que provavelmente não será campeão, tão pouco ajuda a fazê-lo se sentir melhor. E no mundo corporativo, muitas decisões são tomadas por agendas não tão óbvias, e que fogem do nosso limitado alcance e conhecimento. Confrontá-las muitas vezes causa incômodos que nos escapam ao entendimento e podem na verdade até nos pesar negativamente. Finalmente, no âmbito familiar, evitar discussões banais com filhos e cônjuges é quase que nossa obrigação, se queremos viver em verdadeiro estado de amor e plenitude, demandando que toda e qualquer rusga seja seriamente racionalizada e questionada, antes que ela sequer aconteça.
Concluindo, meus caros, cheguei à conclusão de que minha prioridade na vida é ser feliz, não me provar correto em cada argumento e discussão. Se você tem a mesma prioridade na vida, siga esse conselho. Remova o seu ego do caminho, faça um exercício de empatia, e aceite as “verdades” alheias, afinal, a maioria delas (inclusive as nossas) são apenas uma questão de tempo e geografia. Alteradas as condições locais e temporais, a maioria delas necessitarão ser revisadas, pois tudo é relativo. Aceite as diferenças e siga em frente. A vida é muito mais que ganhar uma discussão!